28 de novembro de 2017

Unidas, pequenas farmácias vencem a crise e até crescem mais do que as grandes

As grandes redes de farmácias, com destaque para Raia Drogasil e Drogaria São Paulo, abriram cerca de 500 lojas no país, nos últimos 12 meses terminados em julho, de acordo com a Abrafarma, a associação de redes de farmácias.

A velocidade de expansão dessas empresas, visível em todo o país – a Drogasil abre, a cada ano, cerca de 200 lojas -, reforça a ideia de que as farmácias independentes, aquelas em que o dono fica com a barriga no balcão, seguem no caminho oposto, ou seja, estariam sumindo do mapa.

Não é bem assim. Um modelo de negócio de farmácias, montado por meio de associativismo, que compartilha métodos de gestão e informações, tem sido o remédio para a sobrevivência do pequeno comércio de medicamentos.

Com menos de cinco anos, as bandeiras criadas sob o regime do associativismo Ultra Popular, Maxi Popular, Super Popular, Farma 100, Entrefarma, AC Farma, Mega Farma, Big Fort e  FarMaestra, ligadas à Farmacas, uma empresa que administra bandeiras de farmácias, não pararam de crescer, mesmo em meio à crise.

Juntas, elas possuem 668 farmácias espalhadas em 18 Estados brasileiros e uma receita anual pouco superior a R$ 1,2 bilhão. Com esse modelo, a bandeira na fachada da loja é a mesma, assim como os padrões e os processos internos. Cada farmácia, no entanto, mantém a sua independência.

A Ultra Popular, a mais antiga desse grupo, com 445 pontos de venda, surgiu em 2012, com o apoio de especialistas em gestão da Farmarcas.

O modelo criado deu tão certo, que foi replicado para as outras bandeiras que foram surgindo, a partir da união de donos de farmácias em grandes capitais e no interior. Hoje, a Farmacas opera nove modelos de bandeiras.

Geridas principalmente por famílias, as pequenas farmácias foram vitimadas, antes mesmo da recessão, da falta de profissionalismo na administração do negócio.

A expansão das grandes, profissionalizadas, algumas com ações em Bolsa, e com um mix maior de produtos e serviços, foi mais um ingrediente decisivo para que as tradicionais boticas começassem a perder mercado.

Para dar sobrevida aos pequenos lojistas, a Febrafar (Federação Brasileira das Redes Associativas de Farmácias), criada em 2000, entendeu que era preciso contra-atacar. Ensinar os donos de farmácias a organizar a gestão virou prioridade.

Farmácia precisa de um choque de gestão?

Como administrar o fluxo de caixa, folha de pagamento e estoques, reduzir custos, melhorar o visual das lojas e o atendimento estão entre as primeiras lições ministradas para quem adere ao associativismo.

“Os lojistas passaram a ter indicadores de faturamento, folha de pagamento, custo de cada produto, se obtiveram lucro ou prejuízo no mês, qual a receita por metro quadrado e por funcionários”, diz Paulo Roberto Oliveira da Costa, diretor-geral da Farmarcas, que administra bandeiras de farmácias sob o modelo do associativismo.

Todas as informações de que a farmácia necessita para operar saudavelmente são exibidas em um painel, batizado de PAI (Painel de Aferição de Indicadores), instalado no computador da loja.

Além de o comerciante poder acompanhar em tempo real o desempenho do seu negócio, a Farmarcas tem uma equipe, chamada de Anjo, que assessora o comerciante no dia a dia e em ações consideradas estratégicas.

“O associativismo tem dado muito certo no mercado de farmácias”, afirma Costa. “Havia empresário que não conseguia mais operar e hoje possui dez lojas.”

Farmácia dava prejuízo

Em 2006, o engenheiro agrônomo Luiz Carlos Stanganelli Junior decidiu largar a profissão e seguir os passos do pai, que por décadas operava no ramo.

Adquiriu uma farmácia antiga, da década de 1960, na Praça Marechal Deodoro, bem no centro de São Paulo. A gestão desorganizada quase provocou o fechamento da loja.

“Comecei a sentir dificuldade para tocar o negócio devido a diversos fatores. Não tinha controle das contas, da folha de pagamento, e comecei a sofrer prejuízo. A farmácia estava à deriva. Ou eu organizava tudo, ou fechava”.

Stanganelli diz que descobriu o associativismo em 2012. “Comecei a implantar as ferramentas de gestão mês a mês, para não causar uma revolução na loja.”

Primeiramente, diz ele, foi organizado o setor administrativo. Para tornar a loja mais agradável, como sugeriram os profissionais da Farmarcas, ele recorreu a um empréstimo bancário no valor de R$ 100 mil para reformar a loja.

“Fiz curso de gestão, troquei piso, prateleiras, tudo o que eles sugeriram.”

A farmácia, antes com duas caixas e faturamento de R$ 60 mil por mês, passou a operar com cinco atendentes, que cuidam do atendimento e do recebimento. A receita da loja dobrou em pouco mais de dois anos.

Em vez de uma, Stanganelli tem agora duas farmácias -o segundo ponto foi aberto no Largo do Cambuci. Os planos são abrir mais duas lojas no ano que vem.

“Não coloco a culpa na concorrência, na expansão das grandes redes. Eu não sabia gerir o negócio. Esse foi o maior problema. Hoje, todas as grandes redes estão perto de mim e, ainda assim, estou crescendo”, diz ele. O custo para participar do associativismo é de um salário mínimo por mês.

“Sobreviver sozinho é muito difícil”, afirma Natanael Costa, presidente do Sincofarma, sindicato que reúne as farmácias no Estado de São Paulo.

Há pouco mais de 50 anos no ramo, ele mesmo tem duas lojas em Vinhedo (SP) com a bandeira FarMaestra. “É preciso ter o compromisso de sempre estar inovando e renovando para sobreviver”, diz ele.

“O associativismo tornou a farmácia de bairro profissionalizada, com acesso a informações, mantendo a independência”, diz Edison Tamascia, presidente da Febrafar.

Encurraladas, pequenas farmácias recorrem à franquia

O mercado de farmácias movimenta cerca de R$ 102 bilhões por ano, com aproximadamente 75 mil pontos de venda.

As grandes redes, reunidas na Abrafarma, participam com a maior fatia desse valor –39,6% -, de acordo com dados da IMS Health.

As lojas independentes, aquelas que não estão ligadas às franquias ou ao associativismo, estão em segundo lugar, com participação de 27,9%.

Redes médias, não associadas à Abrafarma, participam com 16%, e as farmácias ligadas à Febrafar (associativismo), com 10,4% do mercado.

Dados da QuintilesIMS revelam que, nos últimos 12 meses terminados em junho deste ano, as farmácias ligadas ao associativismo e às franquias cresceram até mais (14,3%) do que as ligadas à Abrafarma (10,1%).

O faturamento das farmácias sob o modelo associativo subiu de R$ 14,4 bilhões em junho de 2016 para R$ 16, 5 bilhões, considerando um período de 12 meses. No caso das redes ligadas à Abrafarma, de R$ 38 bilhões para R$ 41,9 bilhões, no período.

O mercado de farmácias foi o que menos sofreu com a crise, de acordo com representantes do setor. Em 2015 e em 2016, as redes ligadas à Abrafarma, por exemplo, cresceram 25%, e a expectativa é de expansão de mais 9% neste ano.

“A farmácia é o último setor a entrar na crise e o primeiro a sair dela”, de acordo com Sérgio Mena Barreto, presidente executivo da Abrafarma.

Normalmente, diz ele, as grandes redes crescem 8% ao ano em relação à abertura de novas lojas, com ou sem crise.

A Raia Drogasil, com 1.540 lojas e faturamento de R$ 11,5 bilhões no ano passado, tem aberto cerca de 200 novas lojas por ano, de acordo com Antônio Carlos Pipponzi, presidente do conselho de administração da rede.

A Raia Drogasil pretende continuar expandindo os negócios em todos os Estados do país. “Não existe local no país onde a competição não seja acirrada, com três ou quatro redes fortes por perto”, afirma Pipponzi.

Além da concorrência acirrada, um dos grandes desafios do setor, de acordo com Mena Barreto, será atender novas demandas por serviços.

Uma lei aprovada em 2014, a 13.021, permite que o farmacêutico preste serviços para os clientes, como realizar teste de glicemia.

No primeiro semestre deste ano, de acordo com ele, mais de 300 mil testes de glicemia já foram feitos em farmácias.

A aplicação de vacinas, ainda não autorizadas pela Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária), também deve ser um serviço que passará prestado pelas farmácias.

De acordo com Mena Barreto, existem 700 clínicas privadas de vacinação no país.

Se pelo menos 10% das farmácias (cerca de 7 mil) passarem a aplicar vacinas, o setor vai contribuir para multiplicar por dez  a capacidade instalada de imunização da população.

Para dar conta desses serviços, a tendência é que as farmácias, hoje de aproximadamente 250 metros quadrados, aumentarem de tamanho, especialmente no caso daquelas que também focam em produtos de higiene e beleza, de acordo com Mena Barreto.

Diário do Comércio – por Fátima Fernandes   Editora ffernandes@dcomercio.com.br – http://www.dcomercio.com.br/categoria/negocios/unidas-pequenas-farmacias-vencem-a-crise-e-ate-crescem-mais-do-que-as-grandes

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